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Chico Xavier virou "santo" pelas "bênçãos" da Rede Globo

(Autor: Equipe Dossiê Espírita)

O Brasil tem dessas tristes peculiaridades. Tem uma "cultura popular" surreal, controlada por uma elite de empresários do entretenimento que ditam o "gosto popular" por intermédio de executivos de rádio e TV. E temos ainda uma religiosidade extrema que teima em exercer monopólio sobre a realidade.

Muitos de nós ainda pensam a realidade como se fosse uma novela de televisão. Vemos as coisas de maneira institucionalizada, materialista ou mediante velhos preconceitos morais. Até o "funk" é um reflexo desses preconceitos e dessa imagem estereotipada e idealizada do "bom pobre" que as classes médias, ditas "esclarecidas", se mantém ideologicamente.

Há quinze anos, um ídolo religioso festivo e supostamente ecumênico, símbolo de aparente caridade e portador de uma mitologia ao mesmo tempo contraditória e fantasiosa, faleceu depois de anos doente. O "médium" Francisco Cândido Xavier, aliás, o primeiro anti-médium do Brasil, faleceu com 92 anos de idade, causando comoção entre seus fanáticos seguidores.

Popularmente conhecido como Chico Xavier, seu mito, aparentemente associado a qualidades positivas como "bondade", "humildade", "sabedoria" e "simplicidade", foi na verdade construído, e muiot bem construído, criando uma linearidade ideológica que agrada muitas pessoas, mesmo aquelas que não são consideradas "espíritas".

Mas mito bem construído não quer dizer necessariamente um mito realista. Afinal, é como diz o ditado: "é bom demais para ser verdade". O mito que hoje se conhece de Chico Xavier esconde aspectos bastante sombrios, a partir do fato dele ser um grande e gravíssimo deturpador da Doutrina Espírita.

Como uma versão brasileira de J. B. Roustaing, Chico Xavier difundiu, sob o rótulo de "espiritismo", conceitos extremamente contrários aos que foram originalmente difundidos pela obra de Allan Kardec. O caso aberrante de uma doutrina que renega os ensinamentos de seu precursor já é um atestado de desonestidade doutrinária, que faz desmerecer a alta reputação que o "espiritismo" brasileiro possui oficialmente.

Chico Xavier começou causando muitas confusões. Poeta mediano, ele preferiu investir numa suposta prosa e poética que se dizia "de autores já mortos", trazidas por alegada "comunicação espiritual".

Isso se constituiu numa farsa, na qual Chico Xavier evidentemente não participou sozinho, mas contou com uma multidão de editores e consultores literários, a serviço da FEB e sob a orientação do presidente da entidade, Antônio Wantuil de Freitas.

A farsa pode ser facilmente diagnosticada pelas irregularidades extremas de estilo, identificadas até mesmo em pequenos trechos, às vezes, mas, em outras, evidenciada por textos inteiros. Nomes como Auta de Souza e Humberto de Campos eram creditados em "obras espirituais" que nem de longe lembravam seus estilos originais. Soavam como os fakes da Internet soam hoje.

Só os enganos que Chico Xavier, que personificava o mito mineiro do "come quieto" (referência à imagem dos mineiros como "astuciosos") e, por isso, foi uma espécie de Aécio Neves religioso no seu tempo (o próprio Aécio manifestou profunda admiração pelo "médium"), no qual "fazia das suas" que nunca era punido, já desmerecem tanta idolatria, que chega ao nível da emotividade cega e viciada, uma espécie de masturbação com os olhos pela busca da comoção fácil.

Chico Xavier cometeu muitos males, além de deturpar a Doutrina Espírita e criar psicografias fake. Cometeu juízos de valor cruéis contra pessoas humildes que eram vítimas de infortúnios, acusadas de terem sido "romanos sanguinários". O juízo de valor, ao mencionar encarnação muito distante, era feito à revelia de qualquer teoria da Ciência Espírita e indicava, também, falta de misericórdia e descumprimento do ensinamento kardeciano do "esquecimento de vidas passadas".

O anti-médium - assim considerado por romper com o status de intermediário próprio do ofício de médium - de Pedro Leopoldo e Uberaba também cometeu outras crueldades: expôs demais as tragédias familiares, prolongando-as e alimentando o sensacionalismo midiático, combinado ao fanatismo religioso. 

Ele evitou que pessoas encarassem a dor da perda de entes queridos na privacidade e num luto rápido, e, o que é mais grave, ainda enviou mensagens "espirituais" que soavam fake, produzidas por diversas fontes de pesquisa e interpretação, como a "leitura fria", alegando serem "mensagens espirituais" dos entes queridos, um trote comparável ao dos sequestradores que imitam as vozes de suas vítimas em sinistros estelionatos telefônicos.

O "médium" também difundiu valores ultraconservadores, vários deles próprios da Teologia do Sofrimento, corrente medieval do Catolicismo que fazia apologia da desgraça humana como meio de obter rapidamente as "bênçãos futuras". Com isso, criava mitos perigosos como "inimigo de si mesmo", que contraditoriamente incitava os sofredores a cometer suicídio, prática reprovada pelo próprio "espiritismo" brasileiro.

Há também trechos dos livros de Xavier que sugerem preconceitos sociais graves, como o racismo (quando, em Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, índios e negros eram classificados como "selvagens") e o machismo ("o verdadeiro feminismo é feito dentro do Lar e na prece", ironizava Emmanuel), além do juízo de valor contra pessoas pobres (Cartas e Crônicas).

Não bastasse isso, Chico Xavier pedia para o povo, no auge da ditadura militar, "orar em favor dos militares", que construíam um "reino de amor" sob o sangue de muitos inocentes. E o anti-médium mineiro defendia a censura, ao dizer que "é no silêncio que Deus ouve os apelos dos sofredores".

Obscurantista, Xavier contrariava o legado kardeciano reprovando o questionamento. Odiava ver pessoas reclamando. Mas, quando lhe convinha, ele reclamava, também, como quando chamou de "bobagem da grossa" a desconfiança dos amigos do falecido engenheiro Jair Presente diante de irregularidades em supostas psicografias.

Xavier foi um mito ultraconservador que conseguiu ser empurrado até para a aceitação, um tanto ingênua, de pessoas progressistas, iludidas com a "boa imagem" de seu mito, aliando paradigmas de religiosidade muito retrógrados, mas ainda vistos como tradições a serem mantidas pelos brasileiros.

MITO DO "MÉDIUM BONDOSO" FOI PARA CONCORRER COM NEOPENTECOSTAIS

O que poucos percebem é que o mito de Chico Xavier mais conhecido hoje, o de suposto "símbolo de bondade e amor ao próximo", foi construído mediante uma necessidade de relançar o mito, antes associado a uma paranormalidade confusa e sensacionalista.

Deixou-se de enfatizar o suposto contato com os "literatos do além" e eliminou-se o envolvimento em supostas façanhas como psicofonia e materialização. Sem o tino sensacionalista de Wantuil, Chico Xavier, um mito sempre fabricado à maneira de um popstar, originalmente para enriquecer a FEB com as vendas de livros, sua imagem tinha que ser reciclada para um perfil mais clean, que permitisse a adoração religiosa sem causar tantas confusões.

E aí temos o seguinte contexto, em meados dos anos 1970: convulsões sociais com a crise da ditadura militar, ascensão de pastores eletrônicos (Edir Macedo e R. R. Soares) e desejo arrivista da Rede Globo em estabelecer um monopólio midiático. No "espiritismo", com a morte de Wantuil, veio a "fase dúbia" no qual os "espíritas" professavam um "roustanguismo sem Roustaing e com Kardec".

A FEB e a Rede Globo romperam com a animosidade e iniciaram um casamento feliz. Chico Xavier virou queridinho da Globo e seu mito foi reconstruído a partir de uma fonte internacionalmente conhecida: o documentário sobre Madre Teresa de Calcutá, Algo Bonito para Deus (Something Beautiful for God), de Malcolm Muggeridge, produzido pela BBC em 1969.

Muggeridge, católico de direita, reconstruiu o mito de Madre Teresa de Calcutá - depois acusada de deixar seus assistidos em condições degradantes - como um "símbolo da caridade plena", criando um roteiro digno de novela televisiva, com a "filantropa" posando com bebês no colo e falando frases de efeito que os incautos pensam ser "filosofia".

Todo esse roteiro foi feito para Chico Xavier através de noticiários da Globo, como o Fantástico e o Globo Repórter. Foi um longo trabalho desenvolvido a partir dos anos 1970, o que comprova que a concepção que os brasileiros têm de "doutrina espírita" vem da visão deturpada que a FEB desenvolveu e que foi lapidada pelo discurso da Rede Globo, rede tão poderosa que exerce influência até em parte de seus detratores, que lhe herdam até os hábitos e as formas de ver o mundo.

O mito "ecumênico" de Chico Xavier, associado a suposta filantropia (na verdade Assistencialismo, a caridade que não se interessa em combater os problemas sociais, mas antes minimizá-los sem mexer nos privilégios das elites, as mesmas que premiam os "médiuns" com medalhas e condecorações, tais como ditadores, tiranos e corruptos fizeram com Madre Teresa), foi construído pela Globo para evitar que concorrentes criassem seitas religiosas com forte aparato midiático.

A Globo não conseguiu evitar que a Rede Record, cuja cabeça-de-rede, a TV Record de São Paulo, é remanescente das primeiras emissoras de TV surgidas no Brasil, fosse adquirida por Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus. Mas teve de se consolar por ter conseguido transformar Chico Xavier numa "unanimidade", algo que nos faz lembrar de Nelson Rodrigues, quando certa vez associou a ideia de "unanimidade" a uma estupidez.

Faz sentido. Afinal, a adoração a Chico Xavier revela uma sociedade subserviente às paixões religiosas, com medo de esclarecer sobre a realidade nem sempre agradável da vida, e medo sobretudo de romper com paradigmas conservadores.

Reunindo paradigmas de religiosidade e moralismo bastante conservadores, Chico Xavier virou "santo" pelas "bênçãos" da Globo, e se os brasileiros adoram o "médium", eles expressam um conservadorismo que nem sempre se encorajam a assumir, tão apegados à pretensões e dissimulações que ocultam o lado beato e reacionário de muitos brasileiros, mesmo os ditos "modernos".

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