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Quando Hermione derrotou o "jesuíta do além"

O "espiritismo" brasileiro, na "maravilhosa" obra de Francisco Cândido Xavier, demonstra defender muitos valores retrógrados, associados ao machismo, ao racismo e até ao anti-semitismo, o que nos faz indagar de tanto oba-oba em torno de Chico Xavier.

Tido como "futurista", a religião brasileira se distancia de Allan Kardec e não acompanha as evoluções que acontecem no experiente "velho mundo", preferindo se isolar, no Brasil, através de suas visões conservadoras, moralistas e dotadas de muito preconceito social que põem em xeque todo o burburinho que define o "espiritismo" feito no Brasil como a "vanguarda das doutrinas espiritualistas do planeta".

Observamos o caso recente da atriz inglesa Emma Watson, consagrada pela saga Harry Potter (ela fez a personagem Hermione Grangier), e ela surpreendeu o mundo ao lançar o movimento #HeForShe, um novo feminismo que consiste na integração entre homens e mulheres para a defesa do equilíbrio de direitos entre ambos os sexos.

Na Doutrina Espírita, Allan Kardec já vivia o contexto dos movimentos feministas que aconteciam na vibrante França que se transformava através de movimentos intelectuais diversos, descobertas científicas e tecnológicas e ações ativistas, naquele século XIX que foi conhecido como o Século das Luzes.

Ele escreveu um texto na Revista Espírita, de janeiro de 1866, que acenava para o feminismo, causa apoiada pelo pedagogo francês, até pelo fato dele ser marido de uma importante e atuante professora, artista plástica e intelectual Amèlie Gabrielle Boudet. Escreveu Kardec, no artigo:

"(...) com a Doutrina Espírita, a igualdade da mulher não é mais uma simples teoria especulativa; não é mais uma concessão da força à fraqueza, é um direito fundado nas mesmas Leis da Natureza. Dando a conhecer estas leis, o Espiritismo abre a era de emancipação legal da mulher, como abre a da igualdade e da fraternidade."

Comparando isso com o que se expressou o "moderno espiritismo" brasileiro, observa-se o choque que é a doutrina brasileira, mostrando aí um tom moralista, retrógrado e, sobretudo, machista, do espírito do padre jesuíta Emmanuel, mentor de Chico Xavier, que no livro O Consolador (1941), obra supostamente complementar da Doutrina Espírita, escreveu com tais palavras:

"A ideologia feminista dos tempos modernos, porém, com as diversas bandeiras políticas e sociais, pode ser um veneno para a mulher desavisada dos seus grandes deveres espirituais na face da Terra. Se existe um feminismo legítimo, esse deve ser o da reeducação da mulher para o lar, nunca para uma ação contraproducente fora dele. É que os problemas femininos não poderão ser solucionados pelos códigos do homem, mas somente à luz generosa e divina do Evangelho". 

O texto de Emmanuel, embora empolado como sempre e falsamente elegante, apela para a ironia quando diz que o "feminismo legítimo" deve se voltar para a "reeducação da mulher para o lar", e nunca "fora dele". Emmanuel define o movimento feminista como um "veneno", um processo de "desvirtuamento" dos "deveres espirituais" da mulher.

E o que as "boas energias" do "espiritismo" brasileiro trazem? Um machismo que resiste, mesmo agonizante, que estabelece um falso feminismo duplamente castrado, simbolizado por dois fenômenos que buscam restringir a emancipação da mulher brasileira.

De um lado, mulheres que aprimoram sua inteligência, vestem com elegância, não se resumem a ser "corpos bonitos", mas que são impelidas pelo sistema de valores moralistas que temos a viver sempre sob a sombra de um marido geralmente poderoso e associado a uma profissão de comando e um cargo de liderança ou prestígio.

De outro lado, mulheres que seguem o ideal de "objetos sexuais", verdadeiras mercadorias de consumo erótico, que nada têm a dizer de relevante e reduzem suas carreiras a uma brutal e obsessiva exibição de "corpos sensuais", geralmente siliconados e em formas exageradas.

No primeiro caso, as mulheres tentam superar paradigmas machistas, mas precisam ter o controle simbólico da figura do marido. No segundo caso, as mulheres que seguem o machismo e que no entanto são dispensadas da "figura moderadora" de um marido e namorado.

Isso cria uma imposição e uma condição que o decadente machismo brasileiro determina para a mulher moderna. Em ambos os casos, as mulheres são vistas como "indomáveis" e, ideologicamente, as mulheres que estão dispensadas do controle machista são justamente as que já seguem "por conta própria" os ideais do machismo.

Enquanto isso, a mulher que quiser superar os paradigmas machistas de forma decisiva precisa da figura do marido "poderoso", que minimiza a imagem de autonomia e emancipação da mulher, criando um contexto bastante contraditório.

Junto a isso, há a campanha depreciativa da mídia "popular" em torno de pessoas solteiras, tidas como "vadias", "fracassadas" e "irresponsáveis". Se, no caso dos homens solteiros, essa mídia os define como "derrotados", no caso das mulheres solteiras, elas são promovidas como "vagabundas" que só querem praia e vida noturna e, principalmente, exibir sua "sensualidade" na marra.

Esse triste quadro sócio-cultural deprecia a mulher brasileira, fazendo com que ela seja alvo de preconceito e até vítima de situações como estupro e agressões diversas. E é um país "protegido" pela "boa aura" dos "espíritas" e sua "fé ecumênica", prometendo um equilíbrio de Ciência, Filosofia e Moral que não é posto em prática.

Fala-se tanto que o "espiritismo" brasileiro está na "vanguarda dos movimentos espiritualistas" mas ele permite esse cenário de machismo gritante, com mulheres fazendo carreira como "mercadorias sexuais" no Instagram e outros espaços digitais.

Enquanto mulheres com capacidade de expressar opiniões próprias e bons referenciais culturais têm que viver sob a sombra de maridos "poderosos" (sejam empresários, médicos, advogados, economistas etc), mulheres que nada têm a dizer investem numa solteirice confusa na qual num momento reclamam dos homens, no outro sentem carência deles.

E depois os "espíritas" julgam como "decadente" o "velho mundo" que pôde nos brindar com o exemplo de Emma Watson, que prega o equilíbrio das relações entre homem e mulher, sem forçar os valores retrógrados do machismo. Já o "coração do mundo" anda muito apodrecido.

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